A
convivência com as pessoas é sempre um misto de desafios e pensamentos.
Acredito que ninguém é sequer semelhante ao outro, em sua estrutura física ou
em suas ideias. Ainda que intimamente próximos, temos convicções completamente
distintas daqueles que nos cercam, o que ratifica o verdadeiro desafio de
conviver com outras pessoas. Percebo isso até mesmo em meus filhinhos, que
fizeram 8 anos em julho deste ano (2013). Eles são gêmeos e nasceram da mesma
placenta. A diferença entre os dois, no entanto, é notória. Inclusive na
escolha do time do coração: um Flamengo e outro Vasco. Bem, poderemos falar
disso em outra ocasião...
Minha
fala, entretanto, aponta que, não obstante, percebamos aquilo o que nos
diferencia da sociedade, temos, porém, uma baita de uma semelhança. Algo com o
qual nem tentamos lutar. Ao contrário, nos dias atuais, as pessoas parecem
nutrir essa equidade chamada busca
pela satisfação própria. Quando digo isso, me refiro às convicções que
produzem satisfação ao nosso ego.
Esta é uma palavra grega que significa o pronome pessoal, eu. Felizmente, não há nenhuma
novidade ou demérito em alguém que procura lograr êxito em suas realizações.
Todos, buscamos e queremos nos sentir realizados. Sentir que somos importantes,
e que algum dia quando morrermos alguém sofrerá nossa falta, por amor a nós. O
que há de errado nisso?
Na
verdade, isso também aponta para a semelhança estrutural do ser humano. Como
criaturas de Deus, fomos feitos para amar e sermos amados. Nosso amor
primordialmente nos foi comunicado para ser exercido de maneira absoluta a
Deus, e sendo refletido também em nossos semelhantes. Por isso, Jesus,
sintetiza a lei em dois grandes mandamentos “Amarás, pois, ao Senhor teu
Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todo o teu entendimento; e
[o outro semelhante a este,] amarás ao teu próximo como a ti mesmo” (Mt.
22:37,38; Mc 12:30,31; Lc 10:27,28). Contudo, como bem sabemos, no evento
denominado “a Queda”, o ser humano se desviou do padrão elementar de Deus para
ele.
O
coração, que é chamado pela Bíblia lugar de onde “procedem as fontes de vida”
(Pv 4:23), foi diretamente atacado pela sedição de ser igual a Deus (Gn 3).
Chamamos isso, a origem de todos os pecados. O amor que deveria ser “absolutizado” em
Deus, agora é destinado ao próprio homem. Não conhecemos bem como era o homem
em suas tendências pré-queda, mas este segundo é bem familiar. É possível ver,
no decorrer da história, como os homens se tornaram peritos na busca pela
satisfação própria, se unindo a outros, apenas, quando isso lhes traria algum
benefício. Tudo o que se buscava, apontava para suas “razões” ou suas “verdades”.
Por
certo, esta atitude encontra seu fundamento neste evento (Queda). Após isto,
não é mais possível ao homem retornar ao estado original sozinho. É impossível
para ele sair deste dilema, até que a graça redentora de Cristo Jesus o
alcance, regenerando-o pelo Espírito, restaurando a ele a possibilidade do
empenho de seu amor a Deus novamente. Todavia, ainda sim há uma luta interna no
homem contra aquilo o que chamamos carne. Ele ainda briga com seu “ídolo maior”.
O
professor Ms. Fabiano de Almeida Oliveira, disse em uma de nossas aulas: “Após
a queda, o maior ídolo do
homem é ele mesmo. Ainda que pequenos ídolos surjam como, estabilidade
financeira, estética, sustentabilidade, todos se relacionam com o principal
deles, o eu”. O problema é que quando “absolutizamos” o nosso eu,
colocando-o em primeiro lugar, quem quer que se oponha a isso, se torna alvo de
deflagração de nossa ira, ainda que isso nos custe caro. Um exemplo disso são
os chamados kamikases, que
entregavam suas próprias vidas em defesa de sua nação. Aparentemente, uma causa
nobre, mas o conhecimento intrínseco que revela a identificação da
superioridade objetivada pela nação japonesa, revela seu ídolo maior, o eu.
O
mais interessante é que no cerne de tudo isso, estava o bendito do
conhecimento. Devemos lembrar que a mulher desejara ser como Deus, e
cuidadosamente após isso, lemos, “conhecendo o bem e o mal” (Gn 3:5b). A
história também mostra, principalmente após os pensadores filosóficos, como o
conhecimento (“absolutizado” pela razão) efetivou a parceria definitiva com o
homem, neste processo de auto-idolatria. E isso, de maneira bem sutil, vem se
tornando o maior dos problemas de nossa sociedade. Mesmo entre os cristãos,
podemos ver traços fatais desta realidade.
Não
é difícil ver pessoas que não olham o ensino da Palavra, que aponta para
Cristo, como única fonte de libertação para nossas mazelas. Estão sempre
procurando caminhos que lhes tragam satisfação própria, pessoal. Querendo ser
oportunizadas, como dotadas do chamado de Deus, e denominando-se “impedidas”
por homens. Na verdade, o desejo é o mesmo do velho homem: “quero que as
pessoas saibam que eu também sou”. Não deveríamos
esquecer que se o Senhor nos chamou, ele o fez exclusivamente para um motivo,
sermos para louvor da glória da sua graça (Ef 1:6).
Se
o motivo de nossas preocupações é demonstrar ao mundo que somos chamados por
Deus, por que não o fazemos nas ruas? Por que não visitamos os doentes?
Certamente, há bastante deles que estão aguardando uma Palavra de Deus para
suas vidas. Mas, parece que isso não é tão agradável. A quem? Ao eu! Ele deseja
ser visto, ser suprido idolatricamente. Constatar isso pode não ser fácil.
Pois, é possível tecer textos em redes sociais que agridem as pessoas que são
apenas reflexões públicas caracterizadas como liberdade de expressão. Mas,
quando trocamos nossa visão de mundo para uma cosmovisão tipicamente Bíblica,
percebemos que esta era, na verdade, mais uma necessidade egoística de
satisfação própria.
Devemos
muito cuidar para que, uma vez regenerados pelo Espírito, prossigamos em nos
esvaziar do velho homem (Ef. 4:22). Se nossa satisfação, mesmo sendo chamados
cristãos, ainda se torna plena à base de elogios, exibições, adeptos à nossa
causa (humanística), é fato que estamos amando nós mesmos no lugar onde deveria
estar nosso Criador.
Paulo
afirma do propósito de Deus ter nos resgatado em Cristo, quando diz aos efésios:
“Para o louvor da glória da sua graça,
a qual nos deu gratuitamente no Amado; em quem temos a redenção pelo seu
sangue, a redenção dos nossos delitos, segundo as riquezas da sua graça, que
ele fez abundar para conosco em toda
a sabedoria e prudência, fazendo-nos conhecer
o mistério da sua vontade, segundo o seu beneplácito, que nele propôs para
a dispensação da plenitude dos tempos, de fazer
convergir em Cristo todas as coisas, tanto as que estão nos céus como as
que estão na terra,” (Ef. 1:6-10).
Essa
dádiva claramente indica a ausência de mérito humano, mas uma realização
proposicional de Deus bem definida. Toda sabedoria e prudência que recebemos, é
oriunda de Deus, e somente por Cristo podemos conhecer Sua vontade. Deus se
manifestou na história para proporcionar a libertação ao homem. Fazendo com que
ele finalmente entenda de onde provém o suprimento de suas necessidades.
A
satisfação plena do homem não é atingida pelos seus desejos egoístas, sua
saciedade só se dá quando vive de acordo com sua estrutura original, que aponta
para a adoração a Deus sobre todas as coisas, de maneira absoluta. Esse
conhecimento faz o homem, de uma vez por todas, identificar a si mesmo. Foi
assim que os homens citados na Bíblia se tornaram referenciais a serem seguidos.
Os
homens que realmente tiveram experiências de íntimo conhecimento de Deus
puderam também conhecer a si mesmos. Por isso Jó disse, “Pelo que me
abomino, e me arrependo no pó e cinza...” (Jó 42:6); o salmista declarou: “Não
a nós, Senhor, não a nós, mas a teu nome dá glória...” (Sl 115:1); Isaías
proferiu: “Ai de mim, pois estou perdido...”(Is 6:5); Jeremias
ratificou: “Ai de nós, porque pecamos...” (Lm 5:16); Esdras enfatizou: “Ó
meu Deus! Estou confuso e envergonhado, para levantar meu rosto a ti, meu Deus;”
(Ed 9:6).
Desta
feita, podemos analisar que se vivermos desta maneira perceberemos que não
estamos em um processo de aquisição de títulos de quem é superior aos outros,
ao contrário, constataremos que o sucesso de nossa busca se dá naquilo que nos
conduz à percepção de que devemos ser reconhecidos apenas como servos. Pois, o
Soberano, Absoluto e Superior, a Bíblia já tem nos apresentado quem é. A ele
devemos buscar em primeiro lugar.
Assim, temo que alguns cristãos nos dias atuais, estejam se equivocando, não percebendo a essência de algumas
ações:
Por exemplo, se algum dia
pensarmos que o lugar onde estamos já não é mais suficiente para nós, seria
ideal analisar se nossa saída não está sendo motivada por um desejo egoísta de
sermos reconhecidos como supostamente não fomos, onde estávamos. Isso
pode ser comprovado em um simples sentimento, traduzido em uma "liberdade
de expressão". Sendo líderes e chegamos à conclusão que falta espaço para
nossas pregações ou ensinamentos, por isso saímos; sendo membros e saímos
porque o pastor parece ter me “destratado” – não fazendo aquilo que gostaria
que fosse feito; ou ainda, se busco um lugar onde “(a) o irm(ã)o fulan(a)o não
está...” Quais seriam as justificativas destas motivações???
Existem cristãos hoje que parecem
ser experimentadores de denominações, pois já podem recomendar quase todas, por
seu vasto conhecimento empírico delas. Acho que esquecem que Jesus tem uma só
igreja e é a Igreja do Deus Vivo, a coluna e baluarte da Verdade (I Tm 3:15).
Nossa preocupação deve ser atender as palavras de Deus, que declara: “Em todo tempo estejam alvas as tuas
vestes...” (Ec 9:8); Também o que mais uma vez mencionamos, provérbios
4:23, "Sobre tudo o que se deve guardar, guarda o teu coração, porque dele
procedem as fontes da vida".
Nossos pecados não estão
escondidos de Deus, se é que pensamos isso. Entretanto, Ele está sempre pronto
a perdoar um pecador arrependido, pois um coração quebrantado e contrito, o
Senhor não rejeitará, disse Davi (Sl 51:17). Aí descobriremos, cabalmente, que
nossa satisfação plena consiste na vontade de nosso Senhor. E estaremos aptos a
aprender Dele o que temos que aprender. Cuidemos para que nosso status de crente não seja manchado pelo
prazer secularizado, travestido na busca de um espaço, que na verdade só revela
a necessidade da satisfação de nós mesmos, da nossa razão, do nosso eu.
Que o Senhor tenha misericórdia
de nós!