Quando Jesus disse que somos servos inúteis Ele não quis
dizer que nosso serviço não possui valor nenhum. Jesus frequentemente chamou
seus discípulos a serem produtivos. No entanto, Ele os conscientizou que não há
bonificação ou mérito em seus serviços.
Na Idade Média, uma visão perniciosa se
espalhou, que garantia que cristãos não somente poderiam obter certo tipo de
mérito pelas obras que eles realizavam, mas também poderiam realizar obras de supererrogação – obras tão
valorosas e meritórias – que eles poderiam se elevar ou atingir níveis acima do
que Deus requeria para Seu povo. A Igreja ensinou que o excesso de mérito
dessas obras de supererrogação eram
depositadas no que ficou conhecido como “o tesouro de mérito”, e de lá, isso
poderia ser distribuído a pessoas no purgatório que estavam em débito de
méritos. Esta ideia estava por trás de toda controvérsia sobre as indulgências
no décimo sexto século, e este foi o maior ponto de debate entre Protestantes e
Católicos Romanos. Isso tudo resumia o conceito de que seria possível aos crentes
realizar obras acima ou além do que era esperado.
As palavras de Jesus aqui em Lc 17
certamente colocam esta ideia em seu devido lugar. O que eu poderia
possivelmente fazer que não fosse o que Deus exigisse de mim em primeiro lugar?
Lembre-se, Ele nos manda ser perfeitos, e não podemos progredir em perfeição.
Não podemos sequer esperar alcançar este patamar. Eu não tenho nenhum benefício
em mim mesmo, porque eu não ganho nada fazendo somente o que me é exigido que
se faça. Nisto está o porquê nossa redenção é pela graça e graça somente.
Existe somente uma coisa que eu posso colocar diante de Deus que, falando
apropriadamente, é só meu, o meu pecado. A única coisa que pode me redimir não
é minha obra, mas a obra de Cristo realizada em meu favor. Ele livremente veio
fazer a vontade do Pai e submeter Sua própria vida à lei para nosso bem. Ele, e
somente Ele, é o servo útil.
Se nos servimos de esforços para chegarmos ao reino de
Deus, enganamos a nós mesmos. A motivação para o serviço cristão é amor a Deus.
Não servimos para receber a salvação, mas porque Cristo já conquistou a
salvação por nós. Esta verdade está por trás do verso do grande hino de
Augustus Toplady, “Rock of Ages” que diz, “Nada trago em minha mão, simplesmente
à sua cruz me apego”. Toplady entendeu que após termos realizado nossos
melhores feitos, permanecemos servos inúteis. Não importa o quão exemplar seja
o nosso serviço, não temos nada que poderia ser oferecido a Deus para merecer
Seu favor.
O pastor John Piper tem acordado
pessoas para um conceito de vital importância para nossa fé cristã – a alegria
de ser encontrado em posição de obediência a Deus. John enfatiza qe o motivo de
nossa obediência não deveria ser simplesmente em um sentido abstrato de dever.
É claro que, algumas vezes, temos que obedecer por dever, e isso é melhor do
que a desobediência. Existem momentos quando não há prazer com respeito à
obediência, mas podemos apenas esperar até que sintamos prazer em fazer isso.
Todavia, John está absolutamente correto: isto deveria ser nosso desejo,
obedecer a Deus. Deveríamos nos sentir motivados em servir a Ele cheios de
alegria pelo que Ele fez por nós, não com pensamento de que somos obrigados a
obedecê-lo, ou como se isso fosse algo que nos fizesse ganhar os céus.
Assim, somos servos inúteis – pelo menos
neste mundo. Porém, lembre-se que o mestre na Parábola de Jesus disse a seu
servo: “após isso comerás e beberás”. Nesta simples afirmação encontramos uma
pista da ideia que Jesus torna explicita em Mt 16:27 – que na volta de Cristo,
Ele “dará a cada um segundo suas obras”. Devemos ser cuidadosos com a palavra “segundo”.
Isso não quer dizer que nossas obras merecerão recompensa. Mas, que Deus em Sua
graça distribuirá recompensas de acordo com nosso serviço – apesar de nossas
obras não serem dignas. Essa é uma distribuição graciosa de recompensas;
Agostinho explicou isso desta maneira: “Deus coroando seus próprios presentes”.
Ou seja, mesmo quando recebemos as recompensas do céu, nós as recebemos como
pessoas que, de si mesmas, são apenas servos inúteis.
By R.C. Sproul texto original
Tradução: Jonatas Bento