quarta-feira, 25 de junho de 2014

O que significa ser um "servo inútil"?


Quando Jesus disse que somos servos inúteis Ele não quis dizer que nosso serviço não possui valor nenhum. Jesus frequentemente chamou seus discípulos a serem produtivos. No entanto, Ele os conscientizou que não há bonificação ou mérito em seus serviços.

Na Idade Média, uma visão perniciosa se espalhou, que garantia que cristãos não somente poderiam obter certo tipo de mérito pelas obras que eles realizavam, mas também poderiam realizar obras de supererrogação – obras tão valorosas e meritórias – que eles poderiam se elevar ou atingir níveis acima do que Deus requeria para Seu povo. A Igreja ensinou que o excesso de mérito dessas obras de supererrogação eram depositadas no que ficou conhecido como “o tesouro de mérito”, e de lá, isso poderia ser distribuído a pessoas no purgatório que estavam em débito de méritos. Esta ideia estava por trás de toda controvérsia sobre as indulgências no décimo sexto século, e este foi o maior ponto de debate entre Protestantes e Católicos Romanos. Isso tudo resumia o conceito de que seria possível aos crentes realizar obras acima ou além do que era esperado.

As palavras de Jesus aqui em Lc 17 certamente colocam esta ideia em seu devido lugar. O que eu poderia possivelmente fazer que não fosse o que Deus exigisse de mim em primeiro lugar? Lembre-se, Ele nos manda ser perfeitos, e não podemos progredir em perfeição. Não podemos sequer esperar alcançar este patamar. Eu não tenho nenhum benefício em mim mesmo, porque eu não ganho nada fazendo somente o que me é exigido que se faça. Nisto está o porquê nossa redenção é pela graça e graça somente. Existe somente uma coisa que eu posso colocar diante de Deus que, falando apropriadamente, é só meu, o meu pecado. A única coisa que pode me redimir não é minha obra, mas a obra de Cristo realizada em meu favor. Ele livremente veio fazer a vontade do Pai e submeter Sua própria vida à lei para nosso bem. Ele, e somente Ele, é o servo útil.

Se nos servimos de esforços para chegarmos ao reino de Deus, enganamos a nós mesmos. A motivação para o serviço cristão é amor a Deus. Não servimos para receber a salvação, mas porque Cristo já conquistou a salvação por nós. Esta verdade está por trás do verso do grande hino de Augustus Toplady, “Rock of Ages” que diz, “Nada trago em minha mão, simplesmente à sua cruz me apego”. Toplady entendeu que após termos realizado nossos melhores feitos, permanecemos servos inúteis. Não importa o quão exemplar seja o nosso serviço, não temos nada que poderia ser oferecido a Deus para merecer Seu favor.
O pastor John Piper tem acordado pessoas para um conceito de vital importância para nossa fé cristã – a alegria de ser encontrado em posição de obediência a Deus. John enfatiza qe o motivo de nossa obediência não deveria ser simplesmente em um sentido abstrato de dever. É claro que, algumas vezes, temos que obedecer por dever, e isso é melhor do que a desobediência. Existem momentos quando não há prazer com respeito à obediência, mas podemos apenas esperar até que sintamos prazer em fazer isso. Todavia, John está absolutamente correto: isto deveria ser nosso desejo, obedecer a Deus. Deveríamos nos sentir motivados em servir a Ele cheios de alegria pelo que Ele fez por nós, não com pensamento de que somos obrigados a obedecê-lo, ou como se isso fosse algo que nos fizesse ganhar os céus.


Assim, somos servos inúteis – pelo menos neste mundo. Porém, lembre-se que o mestre na Parábola de Jesus disse a seu servo: “após isso comerás e beberás”. Nesta simples afirmação encontramos uma pista da ideia que Jesus torna explicita em Mt 16:27 – que na volta de Cristo, Ele “dará a cada um segundo suas obras”. Devemos ser cuidadosos com a palavra “segundo”. Isso não quer dizer que nossas obras merecerão recompensa. Mas, que Deus em Sua graça distribuirá recompensas de acordo com nosso serviço – apesar de nossas obras não serem dignas. Essa é uma distribuição graciosa de recompensas; Agostinho explicou isso desta maneira: “Deus coroando seus próprios presentes”. Ou seja, mesmo quando recebemos as recompensas do céu, nós as recebemos como pessoas que, de si mesmas, são apenas servos inúteis.

By R.C. Sproul texto original
Tradução: Jonatas Bento

quinta-feira, 19 de junho de 2014

Certeza e Esperança

“Não andeis ansiosos por coisa alguma; antes em tudo sejam os vossos pedidos conhecidos diante de Deus pela oração e súplica com ações de graças”. (Fp 4:6)
          
           É algo bem natural nutrirmos preocupações. Homens e mulheres são especialistas em viver o amanhã, antes que o hoje termine. O que este estado implica para nós? Ansiedade, ansiedade...e ansiedade. Segundo o dicionário Aurélio, ansiedade pode ser definida como “estado emocional angustiante acompanhado de alterações somáticas (cardíacas, respiratórias, etc.), e em que se preveem situações desagradáveis, reais ou não”.
No Novo Testamento, a palavra merimnaō ocorre 19x. Esta palavra, na grande maioria das vezes, refere-se aos pensamentos de inquietação com relação às incertezas da vida. O apóstolo Mateus utiliza esta palavra para descrever o discurso de Jesus em pelo menos 6 vezes, no evangelho que leva seu nome. Dentre elas, lemos “não vos inquieteis (merimnēsēte), pois, pelo dia de amanhã; porque o dia de amanhã cuidará de si mesmo. Basta cada dia o seu próprio mal” (Mt 6:34).
Alguns ensinos bíblicos parecem ser muito difíceis de serem compreendidos. E este é certamente um deles. Como não ficar preocupados quando nos sentimos ameaçados pela incerteza? Como não nutrir desesperança quando não se vê nenhuma saída? Quantas vezes entramos em buracos que parecem não ter nenhuma escada para sair. E o pior ainda acontece quando a chuva começa a trazer águas para dentro do buraco e não há ninguém para lhe ajudar. É assim que nos sentimos quando olhamos para as circunstâncias à nossa volta, invés de percebermos que o recurso já nos foi dado.
O apóstolo Paulo redige uma epístola à igreja de Filipos com um tom bastante alegre e com muito amor. Pelo exemplo da igreja de Filipos, Paulo fornece admoestações que visam promover manutenção do caminho saudável que estavam seguindo. Essa necessidade de se manter neste caminho é exatamente o que o leva a declarar ao final que não deveriam permitir que a inquietude tomasse lugar na vida deles, fazendo com que esquecessem que Deus é quem controla todas as coisas na vida de seus filhos. Por isso, ele orienta que até mesmo as petições dos irmãos deveriam ser feitas conhecidas a Deus, por intermédio de ações de graças. Paulo está dizendo que deveriam entregar a Deus suas petições e súplicas, de maneira que isso gerasse neles a conscientização que o Senhor está perto deles.
O cristão deve se conscientizar de que quando a esperança lhe falta é porque há incerteza do controle das situações. Este sentimento só vem quando pensamos inutilmente que podemos dominar todos os aspectos de nossas vidas. Quando pensamos que alguma coisa saiu errado isso só revela que somos insuficientes para projetar os nossos passos por nós mesmos, porque somos pecadores. Mas, quando entendemos que as mínimas coisas podem fazer parte do grande propósito de Deus para nos aproximar Dele – por Seu imenso amor – a ansiedade cai e a esperança é revelada.
Qual será a alegria do homem sem Deus? Um carro? Um trabalho? Um baile? A vida é bem curta, as coisas são passageiras. Hoje mesmo, alguém que estava vivo neste mundo, já não se encontra mais entre nós. Mas, a Bíblia nos afirma que por causa da ressurreição de Cristo, a nossa esperança é certa (I Co 15). A quem recorrer, para onde ir? Esta foi a pergunta de Pedro, seguida da afirmativa: “Se só tu tens as palavras de vida eterna!” (Jo 6:68). Se isso não vale de nada em nossas vidas, para que dizer que somos cristãos? É muito melhor falar: “não acredito nisso!” ou até mesmo dizer: “Não creio que Deus possa me ajudar em minhas necessidades!”. E assim revelar que absolutamente não sabemos qual é a nossa real necessidade, porque se soubéssemos...entenderíamos seu controle sobre nosso futuro.
            Deus conhece tanto as nossas vidas que Ele sabe exatamente o que precisa fazer para que prossigamos nosso caminho de santificação. Será que Deus pode nos falar ainda hoje acerca destas coisas? Será que Deus não está proporcionando aquilo o que é necessário para efetuarmos o clamor que Ele deseja ouvir de nós? Não percebemos isso na vida dos personagens das narrativas bíblicas? Não vemos isso na vida de José, sendo afligido por seus irmãos, para ser conduzido ao Egito, para preservação de toda sua família? Na vida de Rute, deixando-a somente com sua sogra para que pudesse se casar com Boaz e fazer parte da linhagem que apontaria para o Cristo? Na vida de Ana, por intermédio da esterilidade para efetuar o clamor e posteriormente fornecer um dos maiores profetas ao Senhor? Que Deus é esse?! É o Deus Todo-Poderoso e que conhece o amanhã, não olhando apenas o hoje como nós – seres limitados pelo nosso próprio pecado.
            A ansiedade é a tristeza profunda pela certeza de que não temos controle das situações da vida, ou de nosso futuro. Mas, isso na vida daquele que se diz cristão é pior, porque diz respeito à insatisfação da consciência de que somente Deus pode ter o controle da vida da humanidade. Estarmos insatisfeitos com o controle de Deus sobre nós é como se estivéssemos dizendo a Ele que seu trabalho não está sendo bem feito. O que quero dizer é que não haverá um ponto em que nossas escolhas individualizadas proporcionarão satisfação se não estiverem centradas no Senhor.
            Somente Cristo pode nos fazer ter boas escolhas na vida. Somente Ele pode nos cuidar. Somente Ele pode nos tirar do buraco que nós mesmos entramos no Éden. Por este conhecimento que Paulo declara que seu trabalho é recompensado, porque o propósito do homem de Deus e da mulher de Deus é fazer com que Cristo seja a certeza da esperança da glória (Cl 1:27). Apenas Ele, pode livrar a humanidade da morte, lhe dando certeza e esperança d(n)a vida.
           
Senhor! Ajuda-nos a compreender que nossa esperança está em ti! Não conseguimos enxergar um palmo à frente de nossos olhos. Nos apegamos em coisas materiais que estão em nossas vidas como ídolos – tentando ocupar o Teu lugar. Perdoe-nos! Somos tão falhos! Ensina-nos a viver os nossos dias entendendo o Teu controle sobre nós, para que estejamos sujeitos à Tua vontade e quem sabe, viver segundo Ela. Sabemos que tens proporcionado as situações necessárias para nos conformamos a Ti, mas precisamos amadurecer mais para enxergar isso.
            Tu és Santo e não permitirá que ninguém menos que isso chegue a Tua presença! Nos ajude, por favor!

 Amém.